C.S. Lewis

livro: Um ano com C.S. Lewis – Ed. Ultimato

livro: Cristianismo Puro e Simples
livro: Peso de Glória

O Novo Testamento, sem entrar em detalhes, nos dá uma idéia muito clara de como

seria uma sociedade totalmente cristã. Talvez nos dê até mais do que podemos
perceber. Ele nos diz que não devem existir nessa sociedade passageiros ou
parasitas; se alguém não trabalha, que também não coma.Cada um deve trabalhar com as
próprias mãos, e o que é mais importante: o trabalho de cada um deve produzir algo
de bom. Não se devem produzir coisas tolas e supérfluas ou de propaganda ainda mais
ridículas para nos persuadir a comprá-las.

Mas não deve haver nenhuma petulância,

nenhum partidarismo ou de criação de “climas” pretenciosos. Até aí, uma sociedade
cristã seria o que chamamos de esquerdista.
Por outro lado, ela estará sempre
insistindo na obediência – obediência (e visível respeito) de todos
nós para com as autoridades legitimamente constituídas, de filhos em relação aos
pais, e (temo que isso será bem pouco popular) das esposas em relação aos seus
maridos.
Em terceiro lugar, ela será uma sociedade animada e alegre, cheia de canto e
regozijo, e que considera a preocupação e a ansiedade totalmente erradas. A cortesia
é uma (das mais preciosas) virtudes cristãs, e o Novo Testamento odeia o que
chamamos de “intrometidos”.

Se uma sociedade dessas existisse e algum de nós a visitasse, acredito que

ficaríamos com uma impressão curiosa. Acharíamos a sua vida econômica socialista
demais e, por esse prisma, muito “avançada”. Mas pensaríamos que a sua vida familiar
e o seu código de conduta estariam muito fora de moda – quem sabe fossem
cerimoniosos e aristocráticos demais. Todos nós simpatizaríamos com alguma parte,
mas bem poucos gostariam de tudo.(...)

Todos nós nos afastamos dele (o plano de uma sociedade assim) em diferentes
direções, e cada um de nós quer assegurar que a sua modificação do plano original é
o plano em si.
Você sempre acabará descobrindo isso de novo, em relação a qualquer
coisa que seja realmente cristã. Cada um é atraído por alguns aspectos e os
considera em detrimento de todo o resto.

(…) A maioria de nós não estuda o assunto para descobrir realmente o que o

Cristianismo diz, mas, sim, com a esperança de achar no Cristianismo um apoio para
os seus próprios pontos de vista. Assim, o que buscamos é um aliado onde só há um
Mestre ou Juiz. Eu também sou assim. Há partes neste livro que eu preferiria
simplesmente deixar de lado, porque discussões como essa não levam a nada, a nã
o ser que percorrêssemos um caminho ainda maior.

Uma sociedade cristã não existirá enquanto a maioria de nós não a desejar realmente

– e nós não a desejaremos enquanto não nos tornarmos plenamente cristãos.

Repito até cansar: “Faça aos outros o que gostaria que fizessem a você”. Mas não tenho a capacidade de suportar isso por muito tempo, até que eu ame o próximo como a mim mesmo. E não posso aprender a amar dessa maneira, enquanto não aprender a amar a Deus. E só posso aprender a amar a Deus, aprendendo a obedecê-lo. Como eu já o havia prevenido, acabamos conduzidos para algo muito mais interno – partindo de assuntos sociais, acabamos nos religiosos. Pois o mais longo caminho de volta é o mais curto para se chegar em casa.