Extraído do livro: Um ano com C.S. Lewis – Ed. Ultimato
Original do livro: O problema do sofrimento
O que entendemos hoje por bondade
divina é quase que exclusivamente a capacidade de amar de Deus; e isso pode até
ser verdade. A maioria de nós entende, nesse contexto, amor como bondade – um
desejo de ver os outros felizes, e não apenas nós; felizes não por isso ou por
aquilo, mas simplesmente felizes.
Será que o que nos satisfaz realmente é
um Deus que diga: “Pouco me importa, desde que eles fiquem satisfeitos”, quando
tivermos vontade de fazer qualquer coisa?
O que desejamos, de fato, não é bem um
pai no Céu, mas um avô no Céu – uma benevolência de gente “velha” que, como se
diz, “gosta de ver gente jovem se divertindo”, e cujo plano para o universo
fosse simplesmente que Ele dissesse ao fim de cada dia: “Tudo isso até que foi
divertido”. Não são muitas as pessoas, admito, que formulariam uma teologia em
termos tão precisos; mas uma concepção não muito diferente dessa se oculta no
inconsciente de várias mentes. Não pretendo ser uma exceção. Gostaria muito de
viver num universo governado por princípios como esse. Mas como está mais do
que claro que não vivo, e já que eu tenho razões para acreditar que, apesar
disso tudo, Deus é amor, concluo que a minha concepção de amor necessita de
correção.
(...)Há bondade no amor; mas amor e
bondade não são sinônimos; e quando a bondade (no sentido de que estávamos
falando) é separada dos demais elementos do amor, ela envolve uma certa
indiferença em relação ao objeto de sua benevolência, ou até mesmo certo
conformismo em relação a ele. A bondade se dispõe de forma bastante rápida à
remoção do seu objeto – todos nós já encontramos pessoas cuja bondade em
relação aos seus animais as leva a matá-los pra evitar que sofram. A bondade
pura e simples não se importa se o seu objeto vem a ser bom ou mau, contanto
que escape do sofrimento. De acordo com as Escrituras são os bastardos que são
mimados; os filhos legítimos, que têm a incumbência de levar adiante a tradição
da família, acabam sendo disciplinados (Hb 12:8). É para as pessoas com as
quais não nos importamos nem um pouco que pedimos felicidade incondicional.
Quando se trata de nossos amigos, cônjuges, namorados e filhos somos exigentes
e preferimos muito vê-los sofrendo do que vivendo em felicidade conformada e
alienante. Se Deus é amor, ele é, por definição, algo mais do que simples
bondade. E parece, a julgar pelos registros, que apesar de Deus ter nos
repreendido e condenado tantas vezes, ele jamais se referiu a nós com desprezo.
Ele nos recompensou pela extravagante benevolência do seu amor por nós, no
sentido mais profundo, mais trágico, mais inexorável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário