quinta-feira, 5 de junho de 2014

C.S. Lewis - Bondade e Amor

                                                                        
      Extraído do livro: Um ano com C.S. Lewis – Ed. Ultimato
      Original do livro: O problema do sofrimento

O que entendemos hoje por bondade divina é quase que exclusivamente a capacidade de amar de Deus; e isso pode até ser verdade. A maioria de nós entende, nesse contexto, amor como bondade – um desejo de ver os outros felizes, e não apenas nós; felizes não por isso ou por aquilo, mas simplesmente felizes.
Será que o que nos satisfaz realmente é um Deus que diga: “Pouco me importa, desde que eles fiquem satisfeitos”, quando tivermos vontade de fazer qualquer coisa?
O que desejamos, de fato, não é bem um pai no Céu, mas um avô no Céu - uma benevolência de gente “velha” que, como se diz, “gosta de ver gente jovem se divertindo”, e cujo plano para o universo fosse simplesmente que Ele dissesse ao fim de cada dia: “Tudo isso até que foi divertido”. Não são muitas as pessoas, admito, que formulariam uma teologia em termos tão precisos; mas uma concepção não muito diferente dessa se oculta no inconsciente de várias mentes. Não pretendo ser uma exceção. Gostaria muito de viver num universo governado por princípios como esse. Mas como está mais do que claro que não vivo, e já que eu tenho razões para acreditar que, apesar disso tudo, Deus é amor, concluo que a minha concepção de amor necessita de correção.


(...)Há bondade no amor; mas amor e bondade não são sinônimos; e quando a bondade (no sentido de que estávamos falando) é separada dos demais elementos do amor, ela envolve uma certa indiferença em relação ao objeto de sua benevolência, ou até mesmo certo conformismo em relação a ele. A bondade se dispõe de forma bastante rápida à remoção do seu objeto – todos nós já encontramos pessoas cuja bondade em relação aos seus animais as leva a matá-los pra evitar que sofram. A bondade pura e simples não se importa se o seu objeto vem a ser bom ou mau, contanto que escape do sofrimento. De acordo com as Escrituras são os bastardos que são mimados; os filhos legítimos, que têm a incumbência de levar adiante a tradição da família, acabam sendo disciplinados (Hb 12:8). É para as pessoas com as quais não nos importamos nem um pouco que pedimos felicidade incondicional. Quando se trata de nossos amigos, cônjuges, namorados e filhos somos exigentes e preferimos muito vê-los sofrendo do que vivendo em felicidade conformada e alienante. Se Deus é amor,  ele é, por definição, algo mais do que simples bondade. E parece, a julgar pelos registros, que apesar de Deus ter nos repreendido e condenado tantas vezes, ele jamais se referiu a nós com desprezo. Ele nos recompensou pela extravagante benevolência do seu amor por nós, no sentido mais profundo, mais trágico, mais inexorável.

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